O último convidado do podcast sobre vinhos “Meia Rolha cast” foi Artur Azevedo, o fundador da VirguWines que foi a Lisboa como “embaixador” dos Vinhos Verdes para falar desta sua paixão e do seu grande sonho…
Artur Azevedo esteve à conversa com os sommeliers Pedro Neves e Daniel Branco, moderadores do “Meia Rolha cast” com experiência em grandes casas, na sua área profissional, e que têm recebido várias pessoas notáveis do mundo dos vinhos nacionais no podcast. O anterior convidado foi Joaquim Arnaud, conceituado produtor do Alentejo e especialista em vinhos.
O fundador da VirguWines sente-se, assim, “um privilegiado” por figurar entre os convidados do podcast que promoveu a prova de dois vinhos. O primeiro dos quais, um Aphros Loureiro 2012, um exemplar de excelência da região dos Vinhos Verdes que Artur Azevedo quis dar a conhecer aos dois anfitriões.
Havia alguma expectativa na prova por ser um “branco verde de 2012”. Mas este Loureiro, a “casta rainha” de Arcos de Valdevez, a terra natal de Artur Azevedo, revelou-se “uma grande surpresa”, como o próprio admitiu no podcast.
Convidado e anfitriões ficaram encantados com a “cor e o nariz” num vinho branco verde com 11 anos, o que comprova que se pode guardar e que ainda tem “muito para dar”.
O outro vinho em prova nesta edição do podcast foi um Woodhaven Chardonnay de 2020 da Califórnia, um vinho branco jovem pronto para consumir produzido a partir de uma das uvas mais plantadas dos EUA.
“Uma empresa de um homem só” que nasceu na garagem
À conversa com os moderadores do “Meia Rolha”, Artur Azevedo falou da sua paixão pelo vinho e de como tem investido nesta área em termos profissionais, embora a sua experiência, neste âmbito, tenha passado, inicialmente, pelo e-commerce e pelo desenvolvimento web como “webmaster”.
Em 2015, lançou a garrafeira online VirguWines e o negócio “explodiu” à boleia da pandemia, altura em que muitos produtores contactaram Artur Azevedo para promover as suas vendas.
Durante a pandemia nasceu também o podcast N2Vinho que tem com moderador o fundador da VirguWines num conceito diferente do “Meia Rolha Cast” que é gravado em estúdio, com uma qualidade de som profissional. Já o N2Vinho é feito online e em direto, com cada participante no seu ponto do país diferente.
Perante a curiosidade de Pedro Neves e Daniel Branco, Artur Azevedo explicou que o nome do seu podcast é uma referência à Estrada Nacional 2 que atravessa o país de norte a sul, uma vez que a ideia era que “representasse o país todo”.
O empreendedor de Arcos de Valdevez destacou no “Meia Rolha” que o N2Vinho e a VirguWines estão “intimamente ligadas”, sendo facilmente reconhecidos e associados pelo seu público.
Dessa ligação, têm surgido histórias engraçadas, como a que se transcreve de seguida e que Artur Azevedo contou no podcast:
“As pessoas conhecem a VirguWines por dentro porque é uma empresa de um homem só, que acontece numa garagem. O podcast está na garagem e as pessoas vêem-me, veem as minhas prateleiras e o stock… E tornou-se normal muitas pessoas que vão passar férias ao Minho, ligarem-me e perguntarem: Artur, posso ir à tua garagem? E tem acontecido!”
O “sonho” VirguWines Cabana Maior
O mais recente sonho de Artur Azevedo nasceu desta peculiar história. Trata-se do VirguWines Cabana Maior, um projeto de enoturismo que Artur Azevedo teve oportunidade de desenvolver no âmbito da Pós-Graduação em Enoturismo que completou recentemente.
A ideia surgiu da necessidade de “arranjar um espaço” para “receber esta gente” que tanta curiosidade tem manifestado pelo universo da VirguWines.
Assim, o empreendedor adquiriu uma pequena quinta, no coração do mundo rural, na freguesia de Cabana Maior, em Arcos de Valdevez. É um espaço para receber clientes da VirguWines, para realizar provas de vinhos e também para alojamento, incluindo ainda uma piscina e uma horta.
Artur Azevedo está a preparar o espaço para abrir ainda este ano (ou para o ano). E, pelo meio, descobriu uma nova vocação como viticultor, conforme relatou no “Meia Rolha Cast”…
“A vinha surgiu por acaso, eu não sou agricultor – ainda que cada vez o pareça mais -, mas a quinta tinha umas leiras que eram muito dedicadas à pastorícia, e surgiu a ideia de plantar lá as castas da Região dos Vinhos Verdes. Eu sonho que se possa vir a provar por lá algum vinho, muito artesanal, feito com aquelas uvas e que possamos andar por lá a penicar, comer, a provar estes vinhos…. É isso que sonho.”
E-commerce dá acesso fácil, rápido e confortável a vinhos exclusivos
A pandemia “deu um boost muito grande a todos os negócios online, particularmente aos vinhos”, notou ainda Artur Azevedo no podcast, seguro de que o comércio online de vinhos “veio para ficar”.
“Já ninguém imagina não ter acesso a vinho online. Até porque não existem noutros lados”, destaca o fundador da VirguWines, garrafeira que disponibiliza produtos que dificilmente se encontram em supermercados.
De resto, esse é o espírito de missão da VirguWines, garantir o “acesso a vinhos que não estão em todas as garrafeiras porque não existe quantidade suficiente”, como explicou o empreendedor no “Meia Rolha Cast”.
Estamos a falar de vinhos de “pequenos produtores que têm mil, 2 mil, três mil garrafas de uma referência” e que só estão presentes em “algumas garrafeiras de referência, em restaurantes muito exclusivos ou online”.
Nesta altura, existe uma grande comunidade online de enófilos que têm vontade de receber em casa o produto, de forma discreta e confortável, com uma venda muito personalizada, sem faturas, sem valores, quase sem referência ao que as encomendas contêm.
Está em causa também a privacidade dos apaixonados por vinho. “Algumas pessoas ficariam chocadas com o valor que as pessoas gastam em vinhos”, notou Artur Azevedo.
De resto, a compra online permite uma pesquisa fácil, com acesso a informações sobre os vinhos e diversidade de pagamentos. E a compra pode fazer-se sem ser necessário “carregar caixas”, com rapidez na entrega, como destacou o empreendedor. A VirguWines entrega “de um dia para o outro, 48 horas no máximo”, salientou.
Para Artur Azevedo, o e-commerce é, cada vez mais, um “serviço complementar às garrafeiras”. Contudo, ainda oferece alguns desafios. “O vasilhame é terrível e para transportar tem outra coisa difícil: é pesado – e ser pesado é um handicap grande para o online”, analisou.
“O Alvarinho tem um terroir fantástico!”
Artur Azevedo apresentou-se no podcast de Pedro Neves e Daniel Branco como um verdadeiro embaixador dos Vinhos Verdes. Eis algumas das declarações que fez neste âmbito, destacando as particularidades dos vinhos desta região e das suas principais castas.
“O Alvarinho tem um terroir fantástico! Estamos a falar de Monção e Melgaço que têm um micro-clima muito interessante. E depois, teve a sorte de ter grandes enólogos que puxaram muito pela casta, seja o Anselmo Mendes, o Soalheiro, a Quinta de Santiago…. É muita gente a mostrar o potencial da casta Alvarinho. E quebraram aquele estigma que existe da Região dos Vinhos Verdes que é o vinho do ano, o vinho fácil…. Fizeram outras coisas diferentes com o Alvarinho!”
“A região dos Vinhos Verdes não é só Alvarinho. Há grandes Alvarinhos e há grandes Loureiros.”
“O Loureiro, muito por culpa da Aphros, mas também de Anselmo Mendes, tem mostrado que pode ser uma casta de grandes vinhos, com potencial de guarda.”
A má fama do vinhão (uma casta com “muito potencial”)
O vinhão é a casta de vinho tinto mais cultivada na região do Vinho Verde, mas continua a ter “má fama”. Diz-se que dá um “mau vinho”, mas Artur Azevedo vê grandes potencialidades nesta casta, como explicou aos moderadores do “Meia Rolha Cast”. Atente nessas declarações de seguida…
“O vinhão é autêntico e muito diferente de tudo o que existe a nível global.”
“Acho que é uma sorte a região dos Vinhos Verdes ter um vinho tão diferente. Estão a surgir projetos muito giros… A Aphros tem, por exemplo, um vinho de ânfora – é pesado, mas já é mais elegante. Está a vender agora um vinhão de guarda de 2009. E estão a surgir projetos que já fogem do vinhão. A região dos Vinhos Verdes é uma região de blend, as pessoas misturavam uvas. ”
“Isto do vinhão, vinhão muito extraído, muito pisado, muito carrascão, é algo relativamente das últimas décadas, isso não existia. Os vinhos, para trás, eram muito mais leves e elegantes, e muito mais ao gosto dos nossos contemporâneos, acho eu.”
“Agora, estão a vinificar o Alvarelhão sozinho, o que está a dar vinhos muito interessantes. A Quinta de Santiago está a fazer um trabalho muito interessante com a marca “Sou” e a Joana Santiago. O próprio Anselmo [Mendes] e a Aphros também que já tem o Ouranos. E vinhos tintos aromáticos, frutados e com algum potencial de guarda, e é muito interessante esse caminho que a região está a seguir.”
“Os pequenos produtores estão a despertar também para perceber que a casta vinhão pode ser elegante, não tem de ter só aquele registo que é interessante na gastronomia tradicional, nos restaurantes regionais… Mas ela tem potencial para mais.”
“O Vasco Croft da Aphros fez um trabalho interessante com o Silenus. Ele foi muito mal-entendido no início. Atualmente, as pessoas já admiram. Na região, ele não vende o Silenus – é um vinhão antigo que passa por madeira, é de colheitas muito antigas. O que se vai vender agora é de 2016, mas o de 2010 estava fabuloso.”
“Eu, aos meus vizinhos, só o posso dar a provar se não disser que é vinhão. Eles adoram aquilo! Quando digo que é vinhão… Não! Isto não é um vinhão! É um vinho incrível!”
“Há vinhos que podem não ter preço sequer”
Os preços de mercado dos vinhos foram outro dos assuntos abordados durante a participação no podcast. Por um lado, há garrafas que podem atingir 10 ou 20 mil euros, mas por outro, existem vinhos que podemos comprar por uns meros 2 euros. Afinal, o que dizer sobre estas divergências? E qual o preço justo? Artur Azevedo partilhou a sua perceção da realidade nos seguintes termos…
“Há vinhos que podem não ter preço sequer.”
“Na VirguWines, trabalho com vignerons – o agricultor, o viticultor que, com as suas uvas, produz o seu próprio vinho – e, nestas pessoas, que respeitam muito o terroir, que são muita honestas com o vinho que fazem, o preço que cobram é o que faz falta. Se não for assim, alguma coisa há-de ficar mal pelo caminho e normalmente é o agricultor.”
“As pessoas com quem eu trabalho estão a fazer um trabalho honesto, a conseguir usar madeira quando é madeira, uma talha quando é uma talha, e isso tem que se pagar. Não estamos a falar de vinhos de luxo, mas são vinhos honestos que têm o seu custo.”
“Deixa-me contar-te uma história – passou-se muito recentemente e mostra bem o quão errado está, por vezes, o mundo do vinho. Uma pessoa que saiu da banca herdou umas vinhas de ramada lindíssimas e a mãe disse-lhe: olha, não faças isso, não vale a pena! Ele, entusiasmado, com tempo, continuou a cuidar das ramadas que, infelizmente, estão em desuso, mas são muito importantes na região dos Vinhos Verdes. Gastou dinheiro no tratamento, na poda, e o valor que recebeu da adega não cobriu o valor da mão-de-obra. Porque depois, vamos ao supermercado e vemos vinhos a 1 euro, 2 euros… O que é que aconteceu? Este senhor que tinha todo o potencial para produzir umas vinhas fantásticas, cortou as videiras. Em primeiro lugar, a adega não faz um vinho honesto e depois, todo o canal não está a preservar o terroir, a sustentabilidade…”
“Os vinhos [demasiado baratos] fazem um mau serviço. Em primeiro lugar, estão a descontinuar uvas que não são tão produtivas, que muitas vezes são muito adaptadas ao território, têm um papel muito importante e com a questão climática estão adaptadas para consumirem menos recursos. E porque as pessoas abandonam algo diferente, algo que seja identificativo. Esses vinhos baratos são todos iguais… Este ano, daqui a um ano, a dois… E há mercado também para isso, mas eu tento fugir disso porque prestam um mau serviço às comunidades – porque não pagam o preço justo ao agricultor.”
E se o mundo acabasse amanhã?
Para terminar, Artur Azevedo foi confrontado com um desafio pelos moderadores do “Meia Rolha Cast”. Se o mundo acabasse amanhã, qual seria a sua última garrafa, aquele vinho que tinha mesmo de beber? Eis a resposta…
“Pegava num Pet Nat da Aphros, um branco, Arinto com Loureiro, com enologia do Tiago Sampaio – os projetos pessoais dele também valem a pena. Para um brinde sem complicações e com bolhinhas!”